(*) Luiz Raimundo de Oliveira
Meses atrás estive em Brasília para compromissos, única e simplesmente, de lazer. Fui visitar minha filha e curtir um fim de semana de muita alegria.
Lá, fui a um barzinho super aconchegante, onde se apresentava o Trio Jazz Sound (bateria, contrabaixo e guitarra). Um som da melhor qualidade, com um repertório esplêndido.
O guitarrista, pelo seu estilo, me lembrou dum outro guitarrista, aqui da nossa terra: Malaquias. Por isso resolvi, em homenagem a ele, escrever este texto.
Malaquias foi meu amigo de infância… ou pré-adolescência, sei lá! Tínhamos um grande apreço um pelo outro. Durante muito tempo ele tentou me ensinar a tocar violão, inutilmente.
Mas ele, desde muito cedo, foi um grande violonista, e depois guitarrista. Tinha ele um jeito muito peculiar de tocar. Ele sentia intensamente cada nota que tirava do instrumento, e elas, agradecidas, enchiam o ar com um grande encantamento.
Era polêmico, Malaquias? Era. Mas, e daí? Ele era um artista na mais perfeita acepção da palavra. Tocou com várias formações musicais. No Restaurante Garimpeiro, a melhor casa noturna de Ponte Nova de todos os tempos, Malaquias tocou com Zeli Mafra, Anselmo, Zé Jiló, Sô Chico Silveira, Zé Prego, Luiz Maurílio, José Maurício e tantos outros que a memória teima em esconder…
Com Malaca fiz muita serenata por esta cidade afora. O seu violão na madrugada era como as harpas dos anjos no céu e o seu som compensava a precariedade da minha voz cantando.
O repertório era o melhor que existia na época: músicas românticas para enternecer corações apaixonados.
Hoje não tem mais serenata.
Hoje não tem mais músicos como Malaquias.
Hoje, infelizmente, pode se dizer até que não tem mais romantismo.
Malaquias dizia que eu teria sido a pessoa que o levou pela primeira vez ao cinema, onde ele assistiu “Em busca do Ouro”, de Charlie Chaplin. E deve ter sido. Na época, para ganhar um troco e, principalmente, para ganhar o ingresso do cinema (Cine Palmeiras) no fim de semana, eu ajudava na limpeza do salão e isso me rendia o privilégio de levar um ou dois amigos, de graça, para assistir os filmes.
Como disse no início do texto, o guitarrista lá de Brasília (cujo nome não sei) lembrou-me Malaquias pela leveza com que ele executava o seu instrumento e aquele som me remeteu ao passado, com uma carga de saudade muito grande desse meu amigo de tantos anos.
Tenho certeza que ele, onde quer que esteja, tem ao seu lado outros amigos que chegaram antes dele (e depois, também) e um violão sempre à mão.
Para encerrar, vou contar um “causo” ocorrido com a gente: voltava eu, de madrugada, da zona, dirigindo, como aprendiz, um Jeep supervisionado por Décio de Abreu, dono do veículo.
Perto da Ponte da Barrinha seguia Malaquias, a pé, rumo a Palmeiras, para onde iríamos. Com certo esforço, parei o carro, e ele subiu. Ao chegar próximo ao (hoje) Posto Morisa ele bateu no meu ombro e disse: “Ô Luiz, não leve a mal não, mas dá uma parada aí que vou descer.
Não vou conseguir chegar a Palmeiras – com você dirigindo, sem cagar na calça. Pare, pelo Amor de Deus!”.
(*) Luiz Raimundo de Oliveira é advogado, escritor e ativista cultural.
Escreve na terceira semana de cada mês.