(*) Vivyane Totino Motta
Muito se fala sobre a criança ferida, mas pouco se explica sobre o que seria de fato, então resolvi contar isso em forma de uma metáfora.
Desde que nascemos começamos a escrever nossa história no livro da vida, tudo que nos’ acontece fica registrado página por página, capítulo por capítulo de cada fase da nossa vida.
Porém, na nossa infância, muitas dessas histórias são escritas a duas mãos, a nossa e a dos nossos pais, a de alguém da nossa família, algum amiguinho, um vizinho ou até mesmo desconhecidos. O ponto é que nessa idade não temos força o suficiente para carregar esse livro e dependemos de alguns adultos para isso e se isso falta, de alguma maneira, o livro cai, a escrita se borra ou se interrompe.
A criança ferida é a representação de um (ou mais) desses capítulos sem final ou mal escritos. O que acontece é que nós seguimos escrevendo os próximos, mas não nos esquecemos deles, nós iniciamos em paralelo uma busca incansável por completar esse capítulo inacabado ou “consertar” o que foi rasurado.
E então seguimos pela vida, com esse livro aberto entregando-o para outros na tentativa de que finalmente esse capítulo seja completado como deveria ter sido. Tentamos com nossos pais por muito tempo (tem gente que nunca para), tentamos com amigos, tentamos com parceiros amorosos, trabalho, compras, vícios, excessos... tudo isso no anseio que algumas dessas pessoas e coisas possam tampar esse vazio que ficou (e que dói) nessas páginas inacabadas.
Só que infelizmente, não dá para voltar nas páginas e apagá-las, pois nossa história é escrita com tinta permanente, também não dá para simplesmente completá-las porque nossa história seguiu sendo escrita, não há espaços em branco.
O que nos cabe como adultos e únicos responsáveis pelo nosso livro da vida, é reler essa história com coragem, entender em que momento e o que faltou, para que possamos, nós mesmos, nos dar isso agora como adultos.
A criança ferida que habita em você, que na verdade são capítulos mal escritos ou inacabados, precisa seguir a vida, deixar pra trás essas páginas como parte da sua história que é imutável, e dedicar toda a sua energia para escrever agora, à sua maneira, as páginas do presente e do futuro.
Nenhuma história pode ser reescrita, mas novos capítulos sim. E agora, diferente da sua infância, você é o único autor desse livro e não depende de ninguém pra isso!
Abraços
Vivy
(*) Vivyane Brandão Totino Motta é psicóloga, analista corporal e mentora de desenvolvimento (CRP04/29776); Instagram: @vivymota.psi; contato: (31) 97358-3024. Escreve na 3ª semana do cada mês, sempre na página 10.